A segunda bienal mais antiga do mundo (perde apenas para La Biennale, em Veneza) e o maior evento de arte contemporânea do hemisfério Sul e das Américas está com suas portas abertas desde quarta-feira (6 de setembro).
Com 121 participantes e por volta de 1.100 obras de arte de diferentes linguagens, a Bienal de São Paulo procurou este ano revelar novas perspectivas sobre o mundo a partir das urgências dos tempos atuais. São mais 30 mil m2 ocupados do pavilhão icônico projetado por Oscar Niemeyer, no Parque Ibirapuera. O espaço que passou por adequações de acessibilidade também recebeu intervenções temporárias em seu desenho para receber o evento.
Confira os 12 destaques da nossa primeira visita:
1- Vão – escritório de arquitetura
O primeiro destaque é justamente o projeto expográfico realizado pelo escritório de arquitetura Vão. O trio de arquitetos formado por Anna Juni, Enk te Winkel e Gustavo Delonero observou no próprio desenho de Oscar Niemeyer momentos que o arquiteto rompe com a linha reta, e a partir desta constatação o trio elaborou uma nova expografia.
O projeto contempla um percurso diferente que tem a intenção de oferecer uma nova dinâmica para o espaço, desafiando a obra modernista. “Nossa abordagem consistiu em dialogar com a estrutura existente e as possibilidades disponíveis. Isso implicou não apenas a atenção na reutilização de materiais remanescentes de exposições passadas, mas também a criação de espaços com base nos elementos construtivos que moldam o próprio Pavilhão”, afirma o trio de arquitetos.
O trio de arquitetos optou pelo fechamento do vão central no primeiro andar e pela criação de novas possibilidades de interação com o espaço.
2. Ibrahim Mahama
Há também outra novidade: a entrada nesta edição mudou. O visitante inicia o percurso pela porta de vidro no final do edifício e não mais pelas laterais. Logo ali um trilho de trem que parece antigo recebe o público. Trata-se de parte de uma obra de Ibrahim Mahama, artista de Gana que resgata elementos coloniais para questionar o passado de seus país e de todos os povos colonizados. Ele retira de contexto e propõe reflexões com o objetivo de trazer novas perspectivas e significados. Os trilhos remetem aos quase 100 anos que Gana foi colônia britânica, período em que alguns ganeses eram tratados como carga ao serem transportados para a região sul do país.
3- Denilson Baniwa
Artista e ativista, Baniwa aborda a questão dos direitos dos povos originários; o impacto do sistema colonial e a valorização da cultura indígena, propondo também reflexões sobre a condição atual do indígena. Ele se destaca na lista de participantes que borram os limites das práticas artísticas.
“Um dos mais destacados artistas de sua geração, Denilson Baniwa propõe uma reelaboração da ideia de arquivo como instrumento pedagógico de reflexão e de fábrica da história. Desde seus trabalhos iniciais, de intervenção sobre gravuras produzidas no contexto da colonização das Américas, até os trabalhos mais recentes, de caráter instalativo e participativo, Baniwa realiza intromissões no arquivo com o objetivo de tensionar e fragilizar o tempo acelerado da conquista e da colonização e fazer emergir o tempo da reflexão, da espera e da escuta”, afirma o crítico de arte Renato Menezes, autor do texto do catálogo da edição.
4- Movimento dos Artistas Huni Kuin – coletivo MAHKU
No segundo andar, os visitantes são recebido pelas obras do coletivo Movimento dos Artistas Huni Kuin – MAHKU (grupo indígena localizado no Acre). As pinturas chamam a atenção pelas cores neon, que buscam traduzir as imagens elaboradas pelo grupo a partir do efeito da erva Avahuasca – ritual tradicional de cura realizado pela etnia.
5- Kapwani Kiwang
Os trabalhos de Kapwani Kiwanga se apresentam através de múltiplos suportes, como instalação, escultura, fotografia, vídeo e performance. Essas linguagens são pensadas sempre em relação às suas pesquisas que tangenciam as histórias marginalizadas, as assimetrias de poder, contra as narrativas históricas – sobretudo os efeitos da colonização das Américas.
Nesse jogo de crítica simbólica e imaginação de futuros possíveis, a instalação “Pink-blue” convida a conviver com a cor em seu estado material. Essa construções são muitas vezes criadas para impactar e controlar o comportamento humano em espaços ou instituições públicas. O Rosa aparece nos sistemas prisionais dos anos 1970 e foi pensado para diminuir a agressividade e o conflito entre os detentos. O Azul foi utilizado de forma intencional em banheiros públicos para diminuir a visibilidade das veias e supostamente reduzir o uso de drogas injetáveis – o que estatisticamente aumentou o risco de injeções perigosas.
6- Rubem Valentin
Os emblemas e objetos de Rubem Valentim transitam entre a arte e a religião compondo um repertório simbólico-mágico em obras de estética geometrizadas que dialogam com a religiosidade afro-brasileira.
O artista Rubem Valentim (1922- 1991) combinava elementos do modernismo e da abstração geométrica com as culturas africanas e afro-brasileiras, e com várias correntes filosóficas e místicas orientais, sempre em busca de uma consciência da terra, do povo.
7- Sonia Gomes
O trabalho não figurativo de Sonia Gomes traz para a discussão temas como raça, gênero e tempo. Ali os materiais evocam histórias, memórias e afetos. Suas peças amarradas, torcidas e costuradas se transformam em objetos escultóricos.
8 – Rosana Paulino
Rosana aborda questões que ainda costumam ser bastante omitidas, como as discussões de gênero e da escravidão e do papel do negro na sociedade. Suas obras costumam tratar principalmente sobre a posição da mulher negra e o racismo.
Com duas série de obras expostas no terceiro pavimento, Rosana Paulino busca soluções para essas coreografias se tornarem possíveis. A artista apresenta nessas pinturas inéditas de entidades femininas que se estruturam nas superfícies com diversas raízes. Poderia ser uma alusão ao corpo natureza de todos os seres humanos adoecidos nesse mundo em crise.
9- Arthur Bispo do Rosário
Arthur Bispo do Rosario (1909 – 1989) viveu recluso por cinquenta anos no manicômio, onde realizou suas criações que, segundo o artista, eram ditadas por anjos para serem apresentadas a Deus no Juízo Final. Concebido como inventário do mundo, esse conjunto artístico foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 2018 e foi exibido em mostras como Brasil + 500 mostra do redescobrimento e da 30 Bienal de São Paulo (Brasil), além da 55ª Bienal de Veneza (Itália).
10 – Wilfredo Lam
“A pintura como um ato de descolonização”, assim afirmava Wilfredo Lam, um dos mais importantes artistas latino-americanos. Filho de uma mulata cubana e de um comerciante chinês, desde criança freqüentava terreiros de candomblé, levado por sua madrinha, a mais importante mãe de santo iorubá de sua cidade natal.
Sua formação artística deu-se em Madri, na Espanha, para onde vai em 1924 com bolsa de estudos, visitando museus e fazendo estudos de belas-artes. Participou da Guerra Civil Espanhola, adotando ideais políticos de esquerda. Com o sala especial na exposição, o artista marca presença com diversas pinturas de seu legado.
11- Francisco Toledo
Um dos marcos do trabalho de Francisco Toledo e expressão de seu engajamento social surge em Papalotes de los desaparecidos [Pipas dos desaparecidos] (2014) – projeto exposto na 35a Bienal de São Paulo.
As pipas criadas com a colaboração dos frequentadores da Oficina de Arte e Papel de San Agustín Etla se somaram aos muitos protestos instaurados no México, desde 2014, quando um grupo de 43 estudantes secundaristas, em sua maioria indígenas, da escola Normal Rural Raúl Isidro Burgos, com sede em Ayotzinapa, no México foram sequestrados pela polícia municipal.
12 – Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel
“Nosso objetivo foi criar uma edição sem categorias ou estruturas limitadoras. Abraçamos um sistema descentralizado, afastando-nos das normas tradicionais. Escolhemos conscientemente não ter um curador-chefe, buscando dissolver estruturas hierárquicas. Nossa lista de artistas abrange um amplo espectro de formas artísticas e vozes de vários territórios ao redor do mundo. Então, a pergunta que permanece é: como as impossibilidades de nossa vida cotidiana refletem na produção artística? As coreografias do impossível nos ajudam a perceber que diariamente encontramos estratégias que desafiam o impossível, e são essas estratégias e ferramentas para tornar o impossível possível que encontraremos nas obras dos artistas”, afirma o grupo curatorial.
SERVIÇO
35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível
Curadoria: Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel
Expografia: Vão
6 setembro – 10 dezembro 2023
ter, qua, sex, dom: 10h – 19h (última entrada: 18h30);
qui, sáb: 10h – 21h (última entrada: 20h30)
Pavilhão Ciccillo Matarazzo / Parque Ibirapuera · Portão 3 – São Paulo, SP
Evento Gratuito